E se esse bem-estar for apenas calorias emocionais vazias?

Vou ter de começar a contar-lhe esta história pelo seu princípio. E o princípio reside no seu genoma. Quando fica submetido a stress crónico, há um aumento na expressão dos genes envolvidos em processos inflamatórios, implicados em diversos problemas de saúde, da artrite aos problemas cardiovasculares. Simultaneamente, diminui a expressão dos genes associados à resposta imunitária. Ou seja, o stress crónico enfraquece-lhe as defesas do organismo e aumenta muito a probabilidade de ter problemas de saúde.

Ainda não lhe estou a falar de felicidade e bem-estar? Um pouco de paciência, que já lá chego.

Ainda preciso de lhe falar de conceitos que vêm da filosofia, que distingue duas formas de bem-estar: hedonismo e eudaimonia. A caracterização hedónica, refere-se àquilo que comummente chamamos prazer: uma jantarada com os amigos, um dia na praia, uma ida ao cinema. Já a eudaimonia, normalmente traduzida por felicidade, e que do grego original quererá dizer “habitado por um bom génio” prende-se com um certo sentido de plenitude, e resulta do investimento que cada um faz em criar sentido na sua vida e um propósito muito para além da auto-gratificação.

Aguentou até aqui? Bravo! Então vamos lá…

Estas duas formas criam-nos a sensação de felicidade, mas as células do nosso corpo reagem-lhes de uma forma muito diferente, discordando parcialmente de nós sobre o que resulta, efectivamente, em bem-estar. Ou seja, dependentemente do que fazemos, podemos sentir-nos felizes, mas estar mal…

O bem-estar que resulta da eudaimonia está, de facto, associado à redução da expressão genética decorrente do stress crónico – dito de outra forma: quando investe o seu tempo, atenção e recursos pessoais na construção de alinhamento com os seus valores, na congruência consigo próprio, num olhar abrangente sobre o seu papel, na construção de um bem maior, no seu desenvolvimento pessoal, no seu foco num propósito superior, está a contribuir para a manutenção da sua boa saúde.

No entanto, o bem-estar hedónico encontra-se associado a um incremento nesta expressão genética, que redunda em inflamação e sistema imunitário enfraquecido. Mas sente-se bem. Acha-se feliz. “Hmmm! Galhofa! Que bom!”. Mas não é bom… As células do seu corpo, cuja função é mantê-lo vivo e de boa saúde, entram em dificuldades. O hedonismo é um consumo de calorias emocionais vazias e inúteis – assim como a boa doçaria portuguesa: sabe muito bem, mas acaba por fazer muito mal, se for em excesso.

E é nesta proporção e equilíbrio que cada um de nós deve apostar. As actividades de auto-gratificação, prazerosas, sem outro fim que não esse, devem constar do nosso cardápio de vida, mas não devem ser prato único ou de consumo a todas as refeições. Mesmo que pareça muito menos “divertido”, o facto é que as acções a que atribuímos sentido, importância ou propósito são aquelas que nos empurram para o verdadeiro usufruto em plenitude da vida.

Oficina de Psicologia
Foto: Louis Hansel

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