Ela é pasteleira, ele cozinheiro. Juntos criaram o “Caos – O Futuro é Vegetal”, uma marca de pastelaria vegan. Sara Soares e Rodrigo Cláudio somam anos de experiência em hotéis e restaurantes por Portugal. A última paragem de Sara foi no Penha Longa Resort onde foi chefe de pastelaria. Já Rodrigo era, até há pouco tempo, chefe de cozinha no grupo Paradigma, onde se inclui os restaurantes The Art Gate e Ofício.
Em entrevista, falam sobre os desafios do projeto e novidades para o futuro.
Como e quando surge a ideia para o projeto?
Esta ideia já estava no meu imaginário há muito tempo, mas não com estes contornos. No dia do meu 35.° aniversário, o Rodrigo planeou uma escapadinha a Évora e foi aí que surgiu a ideia de criar um negócio em conjunto – e naturalmente vegan.
Este negócio divide-se em vários segmentos. Podem falar sobre cada um deles?
Trabalhamos B2B e B2C. Portanto, temos produtos exclusivos para o consumidor final e produtos exclusivos para o canal HORECA, sendo que existem alguns comuns a ambos os segmentos, como por exemplo, as tão adoradas Bolas de Berlim com creme de “ovo”.
A pastelaria vegetal é um tema por explorar em Portugal. Sara, como surgiu o interesse pelo tema?
Comecei por explorar a pastelaria 100% vegetal quando ainda trabalhava no Penha Longa, entre 2017 e 2019, mais concretamente na criação de sobremesas para o LAB by Sergi Arola, uma vez que as restrições alimentares dos clientes assim o ditaram. Na altura foi uma necessidade, que posteriormente despoletou um amor sem igual. Em 2020, fiz um curso intensivo com o Toni Rodriguez, em Barcelona, e desde então tenho vindo a desenvolver o meu próprio receituário e metodologia de ensino.
E tu, Rodrigo? Como foi para ti, sendo cozinheiro, esta incursão no mundo da pastelaria?
O mundo da pastelaria sempre esteve presente na minha vida, na verdade. Em criança ajudava a minha mãe a fazer bolos e acho que essa memória afetiva acabou por ajudar a querer singrar nesta área. Atualmente, sinto que a balança está equilibrada: em casa faço salgados, no trabalho faço doces!
Quais são os desafios de trabalhar com produtos exclusivamente vegetais em pastelaria?
O mais desafiante é conseguir atingir os sabores semelhantes aos tradicionais da pastelaria portuguesa, que é muito baseada em ovos. Um dos nossos segredos é usar sal negro Kala Namak, que confere um aroma intenso e que realmente faz lembrar o ovo. Os lácteos, hoje em dia, já são muito fáceis de substituir até porque existem imensas opções vegetais de qualidade no mercado.
Falem-me sobre o vosso processo criativo.
Pensamos, primeiramente, naquilo que a maioria dos consumidores espera da pastelaria: que seja decadente e indulgente. Depois, transformamos essas noções em produtos, como por exemplo o nosso doughnut de caramelo salgado, amendoim e chocolate NXT Callebaut (chocolate belga à base de “leite” de chufa) – uma perdição que traz o sabor do Snickers a todos os que o provam! Temos também sempre em consideração a sazonalidade e a regionalidade, aproveitando ao máximo os produtos biológicos que temos disponíveis na nossa própria quinta, em Alenquer. Por exemplo, na primavera usamos o nosso próprio sabugueiro no doughnut Pink Lemonade, no verão fazemos o nosso cheesecake americano com cobertura de figos roxos das nossos figueiras, no outono temos compota de gamboa e folha de limoeiro também de produção própria e no inverno temos romã a decorar uma boa parte das nossas criações.
Podem falar de algumas das vossas criações do menu para 2024?
Para além de todos os produtos que já mencionámos aqui e aqueles que publicamos na nossa página de Instagram, como o bolo mármore, o bolo de cenoura e creme de “queijo”, os cookies, os macarons, iremos lançar dois entremet exclusivos para o Canal HORECA, que além de vegan são “glúten free”. Um mais para gulosos, à base de chocolate NXT Callebaut, e outro mais fresco e frutado, com um toque de acidez.
Como é que o público tem acolhido este vosso projeto?
“Primeiro estranha-se, depois entranha-se.” Quem prova, fica fã! Mas para isso acontecer, têm que dar a oportunidade aos nossos produtos de brilharem por si mesmos, sem o estigma geralmente associado às sobremesas vegan – sem açúcar, sem gordura e sem piada!
Sentimos que ainda há essa barreira junto de alguns consumidores e a culpa é dos doces sem sabor, feitos sem qualidade, por pessoas sem conhecimentos técnicos. Damos a volta à questão de forma simples e direta: “the proof’s in the pudding”. Provem os nossos produtos e vão perceber a (grande) diferença!
Onde fazem a vossa produção?
A produção é feita na nossa fábrica, em Alenquer. Temos um espaço totalmente equipado, devidamente licenciado e exclusivo para produção vegetal com vista para a serra do Montejunto. É incrível!
Quais as vossas ambições com o projeto? Abrir um espaço físico passa pelos vossos planos?
Queremos ser a referência da alta pastelaria vegan em Portugal, tanto para o consumidor final como para os nossos parceiros no canal HORECA.
Não planeamos abrir uma loja tão cedo. Queremos chegar às pessoas de outra forma: pelas encomendas, com entregas via CTT para todo o país e pessoalmente na área metropolitana de Lisboa. Para além disso, estamos regularmente presentes em feiras e eventos gastronómicos, como o caso do Lisbon Vegan Market na Fábrica de Braço de Prata. Queremos que esta revolução caótica, no bom sentido, chegue a toda a gente, porque acreditamos que o futuro é vegetal.
Foto: DR