Ponto Cru é uma rubrica que explora primeiro o lado pessoal e depois o profissional dos seus convidados. O convidado que se segue é o chefe Miguel Marques, o novo chefe do Norma, em Guimarães.
Se fosses um ingrediente, qual seria e porquê?
A resposta pode ser cliché, mas seria sal. O sal torna tudo melhor, torna a comida mais feliz, até as sobremesas. E eu gosto muito de fazer as pessoas felizes.
Qual é a tendência gastronómica atual que menos te agrada e porquê?
Os menus serem em QR Code. Adoro ver menus, adoro tocar e perceber como pensa a equipa no geral, a equipa do design e mesmo como pensa o chefe na sua estruturação. Faz-me sentir um pouco mais próximo do restaurante.
Quando vais a um restaurante de fast food, qual é o teu pedido habitual?
Ultimamente tenho estado muito virado para o frango frito, talvez pelo bichinho de um projeto num futuro próximo.
O que gostas de cozinhar quando estás em casa, longe do trabalho?
Quando tenho muito tempo, ramen é claramente a minha comida de conforto para os dias de inverno. Quando tenho pouco tempo, arroz frito com um ovo estrelado, molho de soja, cebolete e já está. Também gosto muito de ao domingo, abrir um dos meus livros de cozinha ao calhas, ver um prato e ir às compras.
Que música não pode faltar na playlist da tua cozinha?
“Sultans of Swing” dos Dire Straits e “Só Queria Sorrir” do Slow J.
Qual foi o maior elogio que já recebeste por um prato que criaste?
Em 2023, no concurso Cozinheiro do Ano na Alemanha, a nossa caixa misteriosa trouxe perna de veado. Recorri ao YouTube para aprender a trabalhar aquela peça e liguei a um antigo chefe para confirmar as técnicas e pedir algumas dicas. No dia seguinte, no momento da verdade, servi o prato a um chefe duas estrelas, o Martin Klein, do Hangar-7. Ao prová-lo, ele disse ao microfone: “Se isto não é lombo de veado, tiro a jaleca e vou embora.” A razão? A carne estava tão bem trabalhada e tenra que ele não acreditava que pudesse ser perna de veado. No final, acabei por vencer. Ele deu-me um abraço e disse que foi a melhor perna de veado que já tinha comido – tanto pelo molho e pelo ragout como pela parte rosada.
Qual é o som mais satisfatório na cozinha para ti?
Adoro quando alguém tenta imitar o som de uma bimby, diz “metes o sal e deixas triturar, trrrrrrrrr. Colocas azeite e a cebola e deixas refogar e faz pshhhhhh”. Mas em termos de cozinha pura, adoro o som de um bife a corar e virar e ver a cor dele, a reação maillard, colocar manteiga e banhá-lo em manteiga, o som, o cheiro é algo que me faz relembrar o quão bonito é cozinhar.
Se pudesses reivindicar a criação de um prato da cozinha portuguesa ou mundial, qual seria?
De cozinha portuguesa, o cozido à portuguesa. Da cozinha mundial, Linguado à Meunière.
Que restaurante tradicional português acreditas que merecia uma estrela Michelin?
Essa é uma pergunta para um milhão de euros! Se o Guia Michelin aplicasse em Portugal os mesmos critérios que usa na Tailândia, restaurantes como O Velho Eurico, em Lisboa, a Gazela, no Porto, e a Garagem 33, em Braga, certamente receberiam estrelas. São espaços que primam pelo produto, pelo sabor e por uma técnica incrível.
Qual é o teu maior sonho enquanto chefe de cozinha?
Ter uma equipa feliz, um restaurante cheio todos os dias e criar ligações neste mundo gastronómico incrível. E, como objetivo pessoal, ouvir o meu nome numa gala Michelin, subir ao palco e vestir a jaleca com uma ou duas estrelas bordadas.
Foto: DR